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Recuperar das Dependências (Adicção)

Contra o estigma, a negação e a vergonha associados aos comportamentos adictivos. O silêncio não é seguramente a melhor opção para a recuperação; ninguém recupera sozinho.

Recuperar das Dependências (Adicção)

Contra o estigma, a negação e a vergonha associados aos comportamentos adictivos. O silêncio não é seguramente a melhor opção para a recuperação; ninguém recupera sozinho.

Tabela E. Morton Jelineck, 1960. Auto avaliação problemas com álcool

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Se nada muda, fica tudo na mesma com tendência para piorar

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Cultura que bebe, abusa e encoraja o consumo do alcool, droga legal. Como profissional, trabalho há mais de 30 anos no tratamento das substâncias psicoativas, vulgo drogas considero que o alcool é a droga mais perigosa. Por exemplo, inicia-se o consumo na adolescência, depois os jovens adultos abusam do alcool, o agravamento dos padrões durante a fase adulta e terminam com problemas de abuso e dependência que se prolonga ao longo de 20 anos, 30 e 40 anos. Uma vida inteira expostos aos efeitos negativas na saude fisica e mental - contra o estigma, a vergonha e a negação. A esta dura realidade, acrescentamos os efeitos na familia ( incluindo as crianças), no trabalho, etc. Conheço casos de indivudos com 60 anos que parecem ter 80. Segundo o site do Sicad (2018) calcula-se que existam mais de meio milhão de alcoolicos cronicos em Portugal e segundo novos estudos morrem, em media, por dia, 20 pessoas cujas causas estão directamente relacionado com o alcool. O alcool é uma droga legal que gera imenso sofrimento às pessoas e pode matar.  Os líderes politicos conhecem esta realidade, não só pelo efeito negativo nas pessoas, mas os  custos para o estado são enormes. Todavia, existe tratamento para o abuso e dependência alcoolica, é possivel recuperar, não me refiro somente ao individuo, mas a toda a familia, incluindo as crianças.

As mulheres estão mais vulneráveis, do que os homens, às consequências do álcool

Ao visualizar este video, recordo as variadíssimas historias de mulheres, que acompanhei em tratamento do alcoolismo (e abuso do álcool), ao longo dos últimos vinte anos, em que todas, são poucas as excepções, referem os danos causados pela doença da adicção e a impotência para travar os abusos físicos, emocionais e sexuais. Traumas que permanecem para a vida e com os quais aprendem a viver, o melhor possível. Enquanto outras mulheres, também sujeitas ao abuso, permanecem em silencio, vitimas do estigma e da vergonha.

 

Ao contrario do que acontecia há vinte anos, actualmente, o numero de mulheres com problemas com o álcool tem  aumentado significativamente. Isto significa que a cultura e os padrões de consumo (e abuso) de bebidas com teor alcoólico, por parte das mulheres, tem sofrido algumas alterações significativas, na minha opinião profissional, para pior, resulta em perda de qualidade de vida.

Veja o video e faça os seus comentarios.

 

Recuperar é que está a dar.

 

Evidência cientifica sobre a doença da adicção.

 Graças aos avanços da ciência, e de alguns profissionais dedicados, como a Dra. Nora Volkow, é possível compreender a natureza da adicção às drogas, lícitas e/ou ilícitas. Nesse sentido, estaremos mais dispostos a desenvolver competências e recursos que nos permitam tratar pessoas com dignidade e esperança. Veja o video  

" O meu nome é..."

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Amavelmente, a Editorial Bizâncio enviou-me o livro "O meu nome é..." de Alastair Campbell (alcoólico em recuperação). Aproveito para sugerir a sua leitura às pessoas interessadas sobre o tema do alcoolismo. 

 

De acordo com a minha experiência profissional de duas décadas, o álcool é a droga mais perigosa: afecta o individuo, a sua família, incluindo as crianças, e a sociedade. Algumas tradições culturais disfuncionais promovem e reforçam o consumo e o abuso do álcool. Paradoxalmente, as mesmas tradições disfuncionais que reforçam o estigma, a negação e a vergonha associado ao alcoolismo.

Saiba mais em Editoria Bizâncio

Dr William D. Silkworth

 Dr. William Duncan Silkworth (1873-1951)

 

27 de Julho de 1938 - O Dr. Silkworth escreve um artigo que é publicado no livro "Big Book", dos Alcoolicos Anónimos,intitulado “A Opinião do Médico" 

 

"Especializei-me no tratamento do alcoolismo durante muitos anos. 

No inicio dos anos 30, tratei um paciente que, apesar de ter sido um homem de negócios competente, com muita capacidade para ganhar dinheiro, era um alcoólico de um tipo que eu tinha chegado a considerar irrecuperável.

Durante o seu terceiro tratamento adquiriu determinadas ideias sobre um possível programa de recuperação. Como parte da sua reabilitação, começou a dar a conhecer os conceitos do seu programa de recuperação a outros alcoólicos, incutindo neles a necessidade de fazer o mesmo com os outros. Este conceito veio a tornar-se a base de uma associação formada por alcoólicos em recuperação e pelas suas famílias em rápido crescimento. Tudo leva a crer que este homem e mais uma centena se recuperaram .

Pessoalmente, conheço também um numero de casos idênticos em que outras abordagens diferentes falharam por completo.

Estes factos parecem ter a maior importância médica, e devido às extraordinárias possibilidades de rápido crescimento inerentes a este grupo, eles podem vir a assinalar uma nova abordagem nos anais do tratamento do alcoolismo. É bem possível que estes homens tenham um solução para milhares de casos de pessoas com problemas com o álcool.

Pode confiar-se inteiramente em tudo aquilo que partilhem a respeito de si próprios.

Atenciosamente, 

William D. Silworth"

 

Comentário: No passado dia 27 de Julho de 2014 celebrou-se setenta e seis anos (76) após a publicação da carta do Dr. Silkworth. Podemos constatar que a sua visão sobre "(...) estes homens..." veio revelar-se uma realidade inquestionável, não só nos EUA, mas em todo o mundo, incluindo Portugal. Faço votos que mais profissionais da saúde, em Portugal, possam também ter uma visão semelhante sobre o tratamento do alcoolismo visto ainda existirem imensos mitos, estigma e falsos preconceitos sobre o programa de recuperação dos Alcoólicos Anónimos.  

RIP, Dr Silkworth.

 

Dia-a-dia na recuperação das dependências

Apresento alguns excertos das pessoas, que diariamente procuram a motivação necessária, a fim de recuperarem a dignidade, a estima e a esperança num mundo em constante mudança. Todos nós, estamos expostos e vulneráveis às mais diversas condições adversas e ao invés de ser a adversidade a definir o rumo das nossas vidas, pelo contrário, somos nós seres fantásticos e resilientes que decidimos romper com aquilo que nos prende à dor e ao sofrimento.

 

No aconselhamento, as pessoas são o mais importante: os seus falhanços são os meus falhanços e os seus sucessos também são os meus sucessos. Ambos partilhamos esta aventura, porque o aconselhamento só é eficiente se o/a terapeuta e o cliente estiverem em sintonia,  na relação terapêutica de confiança, com o mesmo propósito - recuperação.

 

Importante: Todos os dados foram alterados de forma a proteger a identidade das pessoas e qualquer semelhança é pura coincidência. 

 

- Durante a consulta com a Natália, 39 anos (nome fictício – dependência emocional), abordamos a questão da intimidade nos relacionamentos românticos de compromisso: a química do amor (êxtase e o desassossego, vulgo paixão) e o amor duradouro (intimidade e o compromisso). Ela afirmava, com legitimidade, que a fim de manter o relacionamento duradouro é necessário haver entre os parceiros tempo para amar, sem este tempo a relação pode deteriorar-se.

Nota: Sabia que a novidade e o inesperado, por exemplo, quebrar a rotina e fazer coisas fora do comum, mantêm o amor duradouro. Não me estou a referir à paixão

 

- Durante a consulta com o Daniel, 25 anos (nome fictício – problemas com o Jogo), abordamos alguns factores que contribuem para o jogo compulsivo; 1. Jogar (curiosidade, correr riscos e o perigo inerente das apostas). 2. Gestão de sentimentos desconfortáveis, quebrar o tédio, a ansiedade e o aborrecimento 3. Recompensa (prazer intenso) e oscilações bruscas do humor.

Nota: Sabia que ganhar dinheiro não é o mais importante? O mais importante é jogar e apostar.

 

- Durante a consulta com a Anita, 38 anos (nome fictício – problemas com o álcool) e os seus pais abordamos os problemas associados ao álcool e o estigma social. A vergonha de expor o problema e pedir ajuda é tão doloroso que optaram por negar as evidências e as consequências negativas. Durante 10 anos não se falou sobre o assunto, inclusive, com outros membros da família. Afirmaram "Sentíamos que ninguém nos compreendia, pelo contrário, conscientemente, optamos pelo silêncio e pelo isolamento."

Nota: Sabia que o álcool é uma droga e que o alcoolismo é um problema de saúde publica?

 

 

 

A adicção não escolhe parceiros; são todos afectados

Sabia que o alcoolismo e/ou a dependência de substâncias psicoactivas ilícitas afectam o sistema familiar ao longo de varias gerações. Todos, sem excepção são afectados pela adicção, incluindo as crianças, por exemplo, através da negligência e/ou abuso de menores.

 

Consequências prováveis, mas em muitos casos negadas pelo sistema familiar: Abuso físico, sexual e emocional, as necessidades físicas, psicológicas e sociais das crianças são negligenciados.

 

Sabia que muitas famílias, não são todas, afectadas pelo alcoolismo e ou dependência de outras drogas são incongruentes derivado à negação dos sentimentos e à posse de um ou mais segredos entre membros da família.

 

Sabia que as famílias perturbadas tendem a negar os sentimentos, principalmente, os dolorosos. Alguns membros da família, incluindo as crianças, não é permitido exprimir o que que sentem, por exemplo, o sentimento de raiva.

 

As consequências negativas, óbvias da adicção, observadas por todos, como um problema é negada. Acrescenta-se um novo modelo ou sistema falso de crenças de forma a negar a realidade dolorosa, alguns exemplos, o problema é a falta de dinheiro, a relação conflituosa entre cônjuges, o problema é o filho/a que é irresponsável e que exige demasiada atenção, dificuldades no emprego, demasiado stress, etc. etc.

 

A negação da realidade, na família desestruturada, aliado ao sistema de crenças, oculta e retarda o desenvolvimento e o crescimento dos jovens e das crianças, nas áreas fundamentais da sua vida (Brown, 1986). Este tipo de constatação pode ser doloroso, mas caso haja mudança de comportamentos, pode ser o princípio do fim do sofrimento e da confusão.

Algumas características da família disfuncional: negligente, desrespeitadora, incongruente, imprevisível, rígida e por vezes caótica.

 

A recuperação faz toda a diferença

 

De acordo com as últimas investigações, através de imagens de ressonância magnética, sabemos que a adicção é uma doença do cérebro. Determinados comportamentos e/ou o abuso de substâncias psicoactivas interferem e afectam a estrutura cerebral responsável pelo prazer, motivação, memoria (sistema de recompensa). Através dos comportamentos adictivos e abuso de substâncias psicoactivas adictivas, provoca uma modificação dos circuitos neuronais e o aparecimento de sintomas físicos, psicológicos e espirituais no individuo através da procura e recompensa patológica do prazer e alivio imediato. Para que você perceba melhor, esta região do cérebro controla os movimentos do corpo[i]o  núcleo caudado (região do cérebro) situa-se na parte interna é muito primitiva e faz parte daquilo que se chama cérebro reptilário. Esta região do cérebro (sistema de recompensa) evoluiu muito antes dos mamíferos, há aproximadamente 65 milhões de anos. O núcleo caudado ajuda-nos a detectar e a aperceber de determinada recompensa, a seleccionar entre recompensas, a preferir uma recompensa específica, a prever uma recompensa e a esperar uma recompensa.

 

Se você é um adicto/a toda a sua vida (família, trabalho, amizades, saúde, recursos financeiros, etc) gira em torno da recompensa adicção a comportamentos (jogo, compras, sexo, dependência emocional, distúrbio alimentar) e/ou a substâncias psicoactivas lícitas, incluindo o álcool, e/ou ilícitas, geradoras de dependência e fica comprometido em termos das suas decisões (atitudes e comportamentos), por outras palavras; perde o controlo sobre as já referidas substâncias e/ou os comportamentos adictivos.

 

Áreas do cérebro afectadas pela adicção:

  • Recompensa (motivação)
  • Prazer
  • Motora (Aptidão psicomotora)
  • Humor
  • Memoria (processamento)
  • Sono
  • Cognição (défices cognitivos)

Considera que a sua adicção está a comprometer seriamente a sua qualidade de vida e a qualidade dos relacionamentos com pessoas significativas? Se estiver confuso/a em relação à resposta pode enviar um email para joaoalexx@sapo.pt e colocar as suas questões. Todos os dados são confidenciais (sigilo total).

 



[i] Referências bibliográficas

Schultz, 2000; Delgado e colegas, 2000; Elliot e colegas, 2003; Gold, 2003

As 10 desculpas mais frequentes

Quem é gosta de ser confrontado? Ninguém gosta de ser contrariado. Por exemplo, quando alguém é confrontado devido à descoberta de uma mentira ou erro que tenha cometido, qual é a primeira reacção? Negar a realidade. Apesar de haver algumas diferenças, nos comportamentos adictivos o fenómeno é semelhante, um individuo adicto que seja confrontado, pelas consequências negativas da sua adicção, irá responder de uma forma defensiva, esquiva ou omissa. Irá negar qualquer evidência, facto ou realidade.

Irei expor aquelas que são as 10 desculpas mais frequentes identificadas no discurso de indivíduos adictos quando são confrontados e/ou convidados a falar abertamente sobre as consequências da adicção. Gostaria de acrescentar que estas desculpas, mecanismo psicológico de defesa (lógica aditiva), são observadas em vários tipos diferentes de adicção (substâncias psicoactivas lícitas, incluindo o álcool, e as ilícitas, jogo, sexo, compras, dependência emocional, distúrbio alimentar). Gostaria de acrescentar o seguinte, este tipo de discurso também é identificado em alguns membros da família do individuo adicto.~

 

Nº 1 – “Não tenho nenhum problema com o meu comportamento.”

Esta é das afirmações mais comuns e aquela que considero a mais frequente. O individuo adicto não reconhece e ou admite qualquer problema e/ou consequências negativas da adicção. Nesta fase o individuo avalia os efeitos obtidos através das substâncias e/ou comportamentos, como algo positivo e inócuo, contribuem como um reforço da lógica para continuar os mesmos comportamentos; “Se está tudo bem porque é que hei-de parar?”

 

Nº2 – “O meu problema não é assim tão grave, o dos outros é pior. Eu sou diferente e posso parar quando quiser”

Apesar das crises em casa, no trabalho, na saúde (doença) e acidentes o individuo adicto continua a afirmar que consegue parar, e por vezes, é tão categórico nas suas convicções que é capaz de arranjar argumentos que convencem e confundem a esposa/o, as crianças, a família, o patrão/colegas; o individuo também acredita nas suas afirmações. Alguns membros de família afirmam “João Alexandre, ele/a dizia que ia parar, e fazia promessas. As nossas discussões eram de tal angustiantes que eu (mãe, pai, esposa, patrão) algumas vezes achei que estava a ser injusta e cruel para com ele/a.  Nos últimos tempos, praticamente ele fez dezenas de promessas, que eu acreditava nas suas palavras, mas na realidade, ele não conseguia cumprir. Cheguei a pensar que estava a ficar doida e a questionar a minha própria sanidade. ”