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Recuperar das Dependências (Adicção)

Contra o estigma, a negação e a vergonha associados aos comportamentos adictivos. O silêncio não é seguramente a melhor opção para a recuperação; ninguém recupera sozinho.

Recuperar das Dependências (Adicção)

Contra o estigma, a negação e a vergonha associados aos comportamentos adictivos. O silêncio não é seguramente a melhor opção para a recuperação; ninguém recupera sozinho.

Adicção fonte de mitos, tabus e segredos

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É mito? Tabu? Negação? Ou a realidade diz-nos que as crianças também sofrem, em silêncio, com os comportamentos adictivos?

Vamos indagar e procurar compreender este fenómeno observado no contexto de tratamento (em regime de internamento ou regime de consultas ambulatórias) do comportamento adictivos, segundo os pais e seus familiares afirmam: “Os meus filhos não são afetados pela adicção.”

Há três décadas, com demasiada frequência, escuto pais adictos com filhos, e familiares, afirmarem, convictamente, que a dependência de substâncias psicoativas, vulgo drogas, incluindo o álcool e/ou comportamentos adictivos (jogo patológico, relações de dependência, adicção ao sexo, compras, furto nas lojas, adicções cruzadas/comorbilidade) não afetam as crianças. 1) são muito pequeninas, não têm o mesmo discernimento que os adultos ou 2) porque não sabendo do problema não sofrem as consequências.

Algumas afirmações mais comuns.

“Os meus filhos são crianças muito pequenas e não se apercebem do problema da minha dependência.”

“Como pai/mãe jamais faria alguma coisa que prejudique os meus filhos.”

“As crianças ainda não se aperceberam o que se passa lá em casa. Apesar das discussões com a família, não consumo drogas em casa.”

“Posso ter um problema de adicção, mas consigo separar da relação que tenho com os meus filhos, impedido assim que eles sejam prejudicados.”

“A minha dependência não é assim um problema tão grave…consigo controlar a situação.”

“Quando discuto com a minha/meu esposa/o sobre o tema é a dependência não há agressividade e antes levamos as crianças para os seus quartos. Não queremos que elas estejam presentes.”

Apesar de o ser humano, ignorar a evidência científica, este fenómeno, sobre a adicção não afeta as crianças, pode ser mais um caso a juntar a tantos outros?

Na sociedade atual, os exemplos sobre a descrença popular na investigação científica são numerosos e não é possível descreve-los a todos neste texto. Estes exemplos que irei expor são suficientes para constatarmos os factos. Sem mais delongas, vejamos vários casos do conhecimento geral. Segundo a investigação científica está comprovado que a obesidade representa risco de doença cardíaca, colesterol elevado, regimes alimentares altamente calóricos, hábitos sedentários, ausência de exercício físico e seguir uma alimentação saudável. Segundo a investigação científica está comprovado que a dependência do tabaco representa um sério risco de cancro nos pulmões. Segundo a investigação científica está comprovada que a exposição excessiva ao sol está associada a cancro da pele, no verão as praias estão repletas de pessoas, mesmo no período do dia em que a temperatura é mais elevada.

 

 

Filhos de pais alcoolicos

Este texto, enviado pela Renata, veio no seguimento de uma publicação no Facebook onde solicitei o envio de experiências de adultos, que tenham tido pais com problemas de álcool e/ou drogas ilícitas. Eis o relato da Renata.

 

“Tenho um pai e uma irmã que bebem todos os fins de semana, e às vezes, no meio da semana. Vivem dizendo que é normal, e que, como todos fazem , que mal tem ? Mas percebo a incoerência nas atitudes, no modo de vida maquiado como normal, porém completamente fora do contexto. Percebo atitudes completamente diferentes do "viver em conjunto" o álcool ou a adicção retirou deles o pé do chão, como se estivessem literalmente voando ou como se vivessem em outro mundo sendo o convívio muito difícil dado ao fato que podemos ser diferentes mas precisamos concordar em conectar.

Não há dessas pessoas o menor interesse em saber sobre isso ou parar esse processo...sou adicta e “limpa” e esses familiares precisam de ajuda mas talvez a única maneira de ajudá-los seja ficando bem longe!

João, acabo de expor-lhe minha realidade e tem a ver com o post sobre familiares adictos!

Obrigada”

Renata Ramos

 

Nota: Todos os dados foram preservados com a devida autorização da autora. Contra a contra o estigma, a negação e a vergonha. Bem-haja Renata

 

Comentário: Tal como a Renata refere, a estrutura familiar aparenta estar afectada pelo álcool. Segundo alguns estudos, nos EUA, referem:

  • Os filhos de pais alcoólicos estão mais vulneráveis ao risco de desenvolverem problemas com substâncias psicoactivas – abuso e dependência.
  • Os pais que apresentam problemas com álcool e/ou outras drogas podem influenciar os comportamentos dos seus filhos. O consumo e o abuso de drogas, incluindo o álcool, podem ser considerados permissivos entre a família, incluindo as crianças.
  • As famílias afectadas pelo álcool e/ou outras drogas estão mais propensas ao conflito, comparativamente, aquelas famílias que não estão expostas ao problema do álcool e/ou drogas. Os problemas na família giram em torno do consumo e do abuso de substâncias psicoactivas.
  • O ambiente familiar disfuncional, relacionado com o álcool e/ou outras drogas, propicia a negligencia das crianças e a falta de comunicação entre os seus membros; referências parentais, os papéis na estrutura e dinâmica da família e a gestão de conflitos.   
  • Alguns problemas identificados nas famílias com problemas de álcool e/ou outras drogas: Tendência para o incremento do conflito familiar, violência física e emocional, redução da coesão e da organização familiar, stress e isolamento, problemas de saúde e no trabalho, problemas/ conflitos conjugais e financeiros, mudanças drásticas na estrutura familiar, incluindo as crianças.

 

O seu pai e/ou mãe tem um problema com álcool? Ou drogas? Caso você seja filho/a  de pais alcoólicos ou dependentes de drogas ilícitas escreva um pequeno texto sobre a sua experiência a fim de ser publicada no meu blogue. Pela minha experiência profissional de duas décadas e apesar de não existir estudos sobre este tema, existem em Portugal centenas, de filhos de pais alcoólicos ou dependentes de drogas, hoje adultos, que ainda sofrem em silêncio o trauma, o estigma e a vergonha. Recuperar É Que Está A Dar

Importante: Todos os dados são confidenciais. Sigilo total

O açucar em excesso pode tornar-se adictivo

 

Dada a escassez informação para o publico em geral, acabamos por ingerir açúcar, nos mais diversos tipos de alimentos, em quantidades excessivas e nefastas para a saúde. Erradamente, recorremos ao açúcar para nos mimar e "adormecer" as nossas emoções mais dolorosas, alívio típico do stress do dia-a-dia.

O açúcar afeta e pode comprometer seriamente o funcionamento normal do cérebro e assim provocar dependência. Neste caso específico informação é poder. Veja este video interessante e reflicta sobre o assunto em família, incluindo os seus filhos. Siga o link "That Sugar Film"

26/6 Dia para reflexão aprofundada sobre a consciência da realidade

O dia 26 de Junho assinala o Dia Internacional Contra o Abuso de Drogas e o Trafico Ilícito. Este dia, para mim, é de reflexão, onde dedico algum tempo à pesquisa de artigos publicados forma a manter-me actualizado sobre a evolução deste fenómeno avassalador, para uns representou uma verdadeira tragedia. Nomes sonantes vítimas das dependências, recordo, Micael Jackson, Amy Winehouse e Whitney Houston, só para enumerar alguns, sem esquecer os indivíduos desconhecidos e as suas famílias.

 

Em Portugal, estou em crer, que este dia, nunca mereceu a devida atenção e até posso acrescentar que para a maioria da população portuguesa passa despercebido, principalmente devido ao estigma, à negação e à vergonha associados à dependência de substâncias psicoactivas, vulgo toxicodependência. Estamos atrasados duas décadas em relação ao que se pratica, se ensina, investiga e no tratamento das dependências a nível internacional. Trabalho nesta área, desde 1993, e ainda constato, por parte dos profissionais de saúde, um certo tipo de ignorância e/ou desinteresse. Por exemplo, as universidades portuguesas ainda não possuem as condições e os recursos necessários a fim de motivar os seus alunos para a área das dependências. Tenho outro exemplo, mais concreto, conheci vários psicólogos e são unânimes em afirmar que aquilo que aprendem, sobre as dependências nas universidades, é insuficiente. Já para não referir a questão da prevenção das dependências, que tal como o tratamento do abuso e dependência de drogas, é uma matéria que ainda não mereceu por parte dos responsáveis políticos, dos media, dos tribunais e dos advogados, das mais diversas Ordens de profissionais da saúde e da sociedade em geral a devida atenção. Todos nós, eu e você, negamos as evidências óbvias.

 

 

 

Contra factos não há argumentos sobre o consumo de drogas

 

Vidas despedaçadas com consequencias irreversiveis, de acordo com estimativas das Nações Unidas, as mortes por ano relacionadas com o consumo de drogas, no Mundo, podem atingir entre 99 mil e as 253 mil pessoas. De acordo com a mesma noticia, o canábis é a substância psicoactiva mais consumida, seguido pelas anfetaminas, os consumos de cocaína e heroina estabilizaram. «O canabis não mata, mas pode conduzir á loucura»

 

A perspectiva das crianças perante o problema do álcool nos pais

Algumas organizações não-governamentais e agências governamentais, neste caso específico, na Finlândia, decidiram alertar a opinião publica e ajudar a mudar atitudes e comportamentos em relação ao abuso do álcool dos pais e os efeitos nos filhos. Em Portugal somos uma cultura que bebe e reforça o abuso do álcool, entre adultos e jovens menores de idade. O alerta publico na Finlândia também se aplica ao nosso país. 

 

A perspectiva assustadora das crianças perante o problema do álcool nos pais. As maiorias das crianças, de famílias afectadas pelo abuso do álcool e/ou do alcoolismo são negligenciadas ao longo da progressão da doença. Algumas crianças, quando adultas carregam os traumas, para o resto das suas vidas: o alcoolismo passa de geração em geração.

O Alcoolismo ofende os afectos ao longo das gerações - parte II

 

(continuação)

 

Redescobrir a Vida para além da negação e da culpa – Recuperação

 

Quando me refiro ao termo Recuperação (mudança de estilo de vida) aplica-se, não só ao alcoólico, mas a todos os membros da família, incluindo as crianças. Torna-se imperativo identificar e desmantelar a “regra do silêncio”. Enfrentar e lidar construtivamente com o sistema disfuncional dos sentimentos intensos ou reprimidos (a negação, o trauma, a culpa e vergonha, a rejeição e a inadequação, o isolamento, medo e o ressentimento, a ansiedade e a depressão) que comprometem seriamente a hierarquia familiar.

 

Abdicar de atitudes e comportamentos “extremistas”, disfuncionais (erros cognitivos, relacionamento de amor ou ódio) e aprender a viver nas “zonas cinzentas” – novas aptidões cognitivas e do comportamento ex. ser flexível, espontâneo/a, assertivo/a, sentido critico construtivo, honestidade, focado nas soluções em vez de nos problemas, auto estima, responsabilidade e entrega. Não existem relações nem pessoas perfeitas. Em recuperação a família aprende a confiar e a ser autónoma renunciando viver codependente dos outros.

 

Por vezes observo que a “ovelha negra” é aquele membro da família que consegue adoptar atitudes e comportamentos mais saudáveis e equilibrados. Parece reger-se por um diferente conjunto de regras – resiliência. É importante desenvolver novos relacionamentos que funcionem como um “espelho” ou uma referência. Reaprender novas rotinas e crenças (a falar, a confiar e a sentir) em conjunto com outras pessoas. Isto acontece principalmente em Grupos de Ajuda Mutua dos 12 Passos.

 

Mais uma vez, gostaria de reforçar a importância das emoções e dos afectos. Fazem parte do todo complexo (corpo, mente e espírito) é necessário identifica-las (Eu sinto…) monitoriza-las e cuidar delas com amor e respeito. Adquirir talentos cognitivos na gestão das emoções intensas e/ou evitar reprimir. Não se pode ser feliz abafando uma parte viva e criativa do nosso ser. É ok sentir raiva, medo, frustração e insegurança e cometer erros. Por vezes, é ok perder o controlo. Experimente passar o “volante do carro” para as mãos de outra pessoa de confiança e deixar-se levar, usufruindo e gozando a liberdade de escolha e entrega. Um dia de cada vez.


Segundo Tian Dayton, Ph.D é preciso ensinar os membros da família a desenvolverem competências que os ajudem a tolerar “emoções fortes e intensas” sem que necessitem agir nelas (acting out). É preferível falar sobre o que se está a sentir (emoções intensas) naquele momento, através de uma plataforma de entendimento, em vez de explodir ou implodir.


Proponho um desafio. Objectivo: “quebrar a regra do silêncio”. Se você se identifica com algo neste texto siga a minha sugestão: Fale com alguém de confiança sobre os seus sentimentos. Se desejar pode enviar para joaoalexx@sapo.pt relatos ou experiencias significativas escritas associadas a ambientes familiares disfuncionais associados ao alcoolismo. Atraves do seu exemplo em "quebrar a regra do silencio" outros seguiram o mesmo caminho. Recuperar É Que Esta a Dar

 

  

O Alcoolismo ofende os afectos ao longo das gerações - parte I

O alcoolismo pode igualar-se a um conjunto de doenças (ex. doenças cancerígenas, diabetes) que são herdadas na família. Ao contrário destas doenças que referi, o alcoolismo, infelizmente não é sobejamente conhecido e investigado (prevenção, tratamento e recuperação) em Portugal pelas entidades competentes e profissionais.

 

Há muitas gerações, que se perdem no tempo, que pertencemos a uma “cultura que bebe”, que reforça e promove o consumo de bebidas alcoólicas, em alguns casos, até o abuso do álcool é considerado normal, corajoso, destemido, engraçado e divertido.

 

Não é novidade que o álcool é um óptimo “lubrificante” nas relações entre pessoas e também associado a uma “fonte” de lazer e bem-estar. Se no inicio de um acto social, nos sentimos desconfortáveis ou constrangidos, após ingerirmos uns “copos” passados uns minutos já nos sentimos aliviados, desinibidos e “confiantes.”- Muleta extra utilizada para quebrar o gelo. Por isso, muito cedo (em alguns casos durante a adolescência) aprendemos estes comportamentos mas raramente os desaprendemos. Podemos recorrer á “muleta” sempre que quisermos porque sabemos perfeitamente que “Não nos vai deixar mal.”

 

 

Reconheço vários aspectos benéficos no consumo de bebidas alcoólicas na nossa sociedade. É obvio que o álcool consumido de forma consciente e saudável não representa perigo. Várias vezes refiro que o álcool não é o problema nº 1, mas as pessoas (aquelas que não estão informadas, aquelas que o consomem abusivamente e aquelas que o vendem abusivamente). Não sou “fundamentalista”, mas um cidadão (e pai) e um profissional atento aos problemas relacionados entre as pessoas (sociedade) e o álcool.

 

Todavia gostaria de “debruçar” sobre os efeitos do alcoolismo na família, ao longo de gerações, e expor questões que na minha opinião, continuam ignoradas e negligenciadas, o que é grave (CRISE negligenciada). Não é nada que não se saiba, mas raramente se investiga e discute até ao surgimento de notícias trágicas e comoventes – ex. casos extremos violência doméstica associados ao alcoolismo e casos de negligência e/ou abuso (físico, sexual e emocional) de crianças associados ao alcoolismo.

 

 

 

"Tal pai, tal filho" mas com rumos diferentes

Um garoto, a que vamos chamar Júlio, de 15 anos, quando conversava evitava o olhar e falava muito baixo, todavia, era muito doce e muito forte. Morava num bairro social, num T1, no mesmo prédio  mas em dois andares diferentes. No primeiro andar morava a avó que padecia de cancro, em fase terminal, no rés-do-chão morava o pai alcoólico com um cão. Todos os dias, o rapaz levantava-se muito cedo, tratava da casa, preparava o almoço, depois corria para a escola onde era um óptimo aluno, mas muito solitário. Ao final da tarde e de regresso a casa, fazia compras, não esquecia de levar o vinho, lavava o T1 onde o pai e o cão tinham feito porcarias, vigiava os medicamentos, dava comer à pequena família, depois à noite, quando a tranquilidade regressava, oferecia a si mesmo um instante de felicidade, estudava.

 

Um dia, o Julio foi convidado para participar num projecto entre turmas na escola. Ele, dois colegas e o professor estiveram a falar sobre o assunto. Após a reunião, voltou para casa, para as suas duas divisões caóticas, deslumbrado e aturdido de felicidade. Era a primeira vez na vida que lhe falavam amigavelmente, que o convidavam para tratar de um assunto insignificante e abstracto, tão diferente das provações incessantes que enchiam a sua vida quotidiana. Esta conversa (reunião) insignificante, para um jovem de um ambiente familiar normal, adquirira para o Júlio um deslumbramento muito especial e distinto. Afinal, era possível conviver e fazer parte das coisas normais e abstractas. Passados uns anos, antes do exame final do 12º ano, o Júlio, exclamou “Se por desgraça, passar no exame, não poderei abandonar o meu pai, a minha avó e o meu cão.

 

Recordo outro indivíduo a que vamos chamar de Mário, 40 anos, alcoólico e dependente de drogas desde longa data, pai solteiro de duas filhas jovens, que não conhece, vive com a sua mãe de 80 anos, num bairro social, num T1, mais dois irmãos, um de 35 e o outro de 38 também dependentes de drogas e álcool, não sabe ler e escrever e apresenta sérios problemas de saúde consequência da dependência (no fígado). O seu pai morreu, com uma cirrose no fígado, vítima do alcoolismo. O Mário, não completou a primeira classe, como não tinha “jeito” para estudar, foi trabalhar na construção civil, com o seu pai. È um individuo de tracto dócil, simpático e sempre esteve disponível para ajudar os outros.